A intervenção urbana é uma forma de arte cujo objetivo é interagir, de maneira criativa e poética, com o espaço cotidiano e as pessoas. As intervenções são capazes de reinventar, ainda que momentaneamente, novos sentidos ao espaço escolhido e suscitar novas percepções às pessoas.

4.4.16

Sarau do PI: ressoando as vozes femininas

No sábado dia 19 de março aconteceu no SESC Taubaté mais uma edição do Sarau do PI, dando continuidade a temática da Literatura Feminina Contemporânea, iniciada na Casa das Rosas em 2015 com um ciclo de quatro edições.

O sarau do PI é uma tradição, originada em 2010 quando tínhamos nossa antiga sede na zona norte de São Paulo e reunia amigos e pessoas interessadas em partilhar experiências artísticas, pequenas cenas, leituras, performances e canções. Em 2015 o projeto ganha uma nova força com a escolha de abordar a literatura feminina contemporânea e novas artistas, dando voz para essas produções. Assim, ocupamos a Casa das Rosas no primeiro semestre daquele ano, agregando pessoas à discussão e divulgando essas novas produções.

Agora em março a convite do Sesc Taubaté levamos esse formato para cidade, realizando um sarau intimista, de muita troca e diálogo. Na programação tivemos o bate-papo mediado pela Talita Mochiute, parceira nossa para área de literatura, com a escritora Lilian Aquino e as poesias de seu livro “Pequenos Afazeres Domésticos” e de Michele Santos, organizadora do Sarau Sobrenome Liberdade, que recentemente lançou o seu livro “Toda Via”. A conversa versou sobre as desigualdades ainda presentes no cenário artístico e literário da divulgação e espaço para produções de mulheres. O lugar de onde se escreve que é sempre carregado da história de cada pessoa.  Aqui, Michele ressaltou a importância dos movimentos de saraus e escrita independente na periferia para quebra do “EU” masculino e contribuindo para formação de outras perspectivas para jovens e garotas além do universo doméstico.  Lilian ainda colocou na prosa, os poemas de Ana Cristina César.

Mais uma vez, tivemos a presença de Paula Castiglione, grande amiga, interpretando com voz e piano grandes compositoras brasileiras: Chiquinha Gonzaga, Dolores Duran, Carolina Maria de Jesus e Rita Lee. Sem contar, a irreverência de Priscilla Toscano e Paula dando vida à musica Mulher de Fases.  Relembrando que durante muito tempo na nossa história as mulheres eram caladas ou suas composições eram assinados por homens. Ainda tivemos o experimento meu e de Priscilla de uma versão para a ação: O que você carrega na sua bolsa? , em que retiramos da bolsa objetos que transformam a nossa aparência, elementos da imposição de padrões e comportamentos sociais. Ao final, nos livramos deles e deixamos no espelho a frase: Nossos corpos, nossas regras.

Corte
Decidiu raspar os cabelos
Ela mesma
Sua intimidade com tesouras
E objetos pontiagudo
lhe dá esse ar
louco, redemoinho.
E careca,
É mais fácil sangrar.
(Lilian Aquino)

O encontro, mesmo breve, teve muita participação das pessoas, lendo seus poemas preferidos, suas histórias, falando de si e do mundo, tornando a palavra uma escuta coletiva. No espaço, também deixamos uma pequena instalação poética com um varal de postais e poemas como um cantinho sagrado de uma casa que reconta as memórias de quem ali vive, nesse caso, as lembranças de nossa trajetória.  Por fim, terminamos com a performance Me traziam a Lembrança daqui ... de Luanah Cruz,  no qual a artista se relaciona com o público usando um vestido de mais de 30 metros, um corpo-feminino-tapete, que se transforma ao longo da ação com poesias, desenhos, histórias deixados pelo público. Luanah caminhou pelas ruas da unidade, deixando um rastro ali de nossa passagem.
 
O sarau, trazendo as palavras de Talita: é mais um desses encontros importantes que nos lembram que não estamos sozinhas.  Para mim, que sugeri para o PI o disparo inicial de criarmos um sarau sobre literatura feminina lá em 2014, vê-lo acontecer sempre traz a possibilidade de compartilhar palavras, memórias, zonas de silêncio e, sobretudo, fortaleça a luta por uma sociedade menos Ele e Ela e mais NOSSA ou seria ENTRE?

Entre ser com
E ser contra
Sejamos entre
(Michele Santos)

Por Pâmella Cruz